sábado, 29 de agosto de 2015

A Loira



 Ela é o tipo de mulher que o Bukowski olharia e pensaria: “Diabos, tá aí uma mulher que pode fritar os miolos de um cara só com o olhar.” Tem aquele equilíbrio perfeito entre saber ser anjo e quando ser o oposto. Chega a ser ridículo a forma como se move em sincronia com o universo, como se dissesse que o sol gira em torno dela, e não a terra em volta dele. Os cabelos cor de luz? Só mais uma de suas muitas formas de encanto, a forma como ELA (sim ELA em caixa alta mesmo, como uma divindade feita de carne e osso), tira a franja dos olhos com um sopro, pra revelar os olhos castanhos que te encaram e fazem que até o mais malandro “bon vivant ” perca a pose e se sinta intimidado com aqueles olhos que mesmo necessitando de óculos não deixam de ser incríveis. Aliás os óculos dão aquele ar angelical que só ela sabe ter, que só ela sabe ser.
É até engraçado. Porque quando você ouve essa descrição logo pensa: _ Cara, essa mulher é inatingível.
Mas não meu amigo, claro, que se você for dar em cima dela, cheio de onda, malícia e o caralho a quatro, vai tomar um toco que vai te fazer perder o caminho de casa. Nesse jogo ELA quem escolhe quem vai jogar e em que posição.

sexta-feira, 17:30hrs
 Era um dia como qualquer outro, cheio de tédio. E o escritório tinha menos movimento que briga de tartaruga, mas faltavam 15 minutos para o fim do turno. Jogado numa cadeira, desconfortável pra cacete, ficava imaginando porque tinha parado de fumar.
 Ele já a conhecia fazia alguns anos, mas, nunca alimentou a esperança de que teria alguma chance com aquela Vênus tupiniquim. Era só o amigo, chamado carinhosamente de “Nego” por ela.
Mas esse dia, os deuses resolveram pregar uma peça nesse cara tranquilo e largado, de barba por fazer, que trabalhava num emprego que não era sua área de formação.  Enquanto regava seu bonsai de pinheiro, o celular toca e no visor do aparelho aparece aquele rosto que sorria interrompendo tudo, até mesmo a rotação da terra.
Atrapalhado como ele só, atende de qualquer jeito.
_ Oi, o que manda minha loira.
_ Trem, vamos pro bar? Aquele boteco do centro, que a fica perto da faculdade.
_ Ah, sei não loira, dia ruim pra rolê.
_ Caralho meu, sexta-feira, dia de cerveja, tequila, jogar conversa fora e ouvir música ruim.
_ Olha a boca porra. Que horas, quem vai? (Ele não estava nem um pouco afim de sair, mas ELA é o tipo que te convence a ir até em missa de sétimo dia de defunto desconhecido.)
_ Lá pras oito, vai eu e o José
_ José?
_ É, José Cuervo. Tô te esperando lá.
_ Mas... Filha da... Desligou na minha cara.
É agora ele tinha que ir, sabia que se não aparecesse ELA ia ficar puta e xingar ele de tudo que é nome, incluindo palavras que não existem, mas que seriam criadas e dadas sentido pejorativo no momento.
Então juntou suas tralhas e foi pra casa. Como alguém sem pretensão, sem esperança de nada, além de umas risadas, e provavelmente um bom porre . Ao sair do banho, vestiu uma calça jeans surrada, uma camiseta branca com uma estampa engraçada, e jogou a jaqueta de couro preto por cima, nos pés um ALLSTAR cano baixo que parecia ter saído de um disco do Nirvana.
Chegou ao bar, sentou e pediu um conhaque, como sempre ELA estava atrasada. Já era natural, então ele se deixou cair na cadeira e saboreou o burbom como se realmente entendesse do assunto. Umas garotas sentadas na mesa próxima ficaram lhe olhando, mas ele não percebeu, era tapado demais pra isso.
Mas de repente o mundo parou, o ar pareceu se incendiar, um perfume de doçura leve invadiu o olfato, e ELA entrou, não estava vestida como as atrizes de clichês hollywoodianos, cheias de penduricalhos, cabelos esvoaçantes e maquiagem carregada. Não, ELA estava de vestido preto, bota de cano e salto baixo, e um sobretudo de tecido fino e branco por cima de tudo. Os cabelos soltos e os óculos de um grau forte pra cacete terminavam de compor o personagem que nem Shakespeare conseguiria criar.
Sem se mexer, ele a cumprimenta.
_ Oi loira,
_ Oi o cacete, levanta e fala comigo direito.
_ Mas “num guenta” ver ninguém exercendo o direito ao sedentarismo que já quer “atrapaiá”.
_ Hahaha. Levanta logo trem.
Ele se levanta e dar um abraço nela, daqueles de tirar a pessoa do chão. Junto com aquele beijo estalado na bochecha. Nesse momento ele perde o interesse das garotas da mesa ao lado, mas quem liga pra esse detalhe? Ele não percebeu que elas estavam olhando mesmo.
_ O que “cê” tá bebendo Nego? – Pergunta ela sentando e pegando o copo dele.
_ Conhaque, vai com calma que isso não é leite. – Ela já tinha tomado um gole e feito careta. Mas continuou bebendo.
_ Começou pesado hein. – Ela faz sinal pro garçom que se aproxima. – Moço traz uma cerveja e duas tequilas pra gente.
_ E eu que comecei pesado né pudim de pinga?!
A partir daí não preciso dizer que a conversa rolou em um clima absurdamente descontraído e etílico. A intimidade, e o álcool sempre criam senários perfeitos pra romances e trapalhadas, e esses dois eram campeões no segundo item.  
Era pra serem uns drinks, e só, mas aquele não seria mais um dia qualquer, e já era umas 21h30min quando eles deixaram o assunto morrer. A essa altura, já tinham trocado as cadeiras de lugar, sentando um do lado do outro, já tinham cantado junto e pedido música ao cara que se apresentava no bar, que, aliás, era horrível. E o assunto morreu, no meio de uma gargalhada, por um assunto que eles nem se lembram mais...  Nesse momento talvez se imagine que ele encarnou um Richard Gere e a tomou nos braços, mas não, a atitude partiu DELA, ela o beijou, pôs a mão na nuca dele e tacou-lhe um beijo.
O mundo mudou de cor, de forma, ele ficou sem ação, ou quase sem ação, um beijo daquela Vênus é algo que não se pode ignorar. E a surpresa deu lugar a fome, a vontade, ao tesão.
Não se perguntaram o porquê, simplesmente fizeram.  Os beijos ficaram mais sedentos, ganharam mordidas nos lábios, e foram parar no corredor que dava acesso ao banheiro do bar. Fazendo com que os amassos ficassem mais intensos e quentes que o próprio fogo.
Antes de serem presos, ou pararem numa delegacia por atentado violento ao pudor público, resolveram sair do bar e ir para um lugar privado. Seguindo o instinto visceral que só os verdadeiros amantes possuem, não fizeram escolhas planejadas, não criaram trajetos, ou verificaram custo benefício. Isso é pra quem tem tempo em demasia e tesão em falta.
Acabaram se “hospedando” num hotel, desses caros que tem no centro da cidade, cheio de frescuras e sem muito conforto. Mas quem liga pra preço quando a carne grita por prazer?
Antes mesmo de chegarem a cama, suas roupas já estavam mais longe do corpo deles do que se pode imaginar, era como se as próprias peles exigissem se verem livres das camadas de pano que as aprisionavam. Que ainda lhes dava um pequeno senso de pudor e moralismo.
O que se seguiu foi uma peça, uma coreografia, criada pelo tesão, pelo excesso de álcool e por uma vontade que talvez nunca tivesse sido permitida sentir por nenhum deles. 
A barba dele roçando o pescoço DELA, os seios DELA sendo devorados por ele, uma fome que era saciada no outro. E assim se seguiu noite adentro, entre gemidos, suspiros, respiração alta, naquela voracidade, e desespero de quem sabe que o mundo vai acabar amanhã.
E lá pelas 04hrs quando não existiam mais forças, quando as costas dele estavam quase sem espaço para serem arranhadas, quando as pernas DELA formigavam pelo esforço, e suas coxas estavam arranhadas pelo contato da barba na virilha. Eles descansaram, ELA deitada no peito dele, ele doido por um cigarro pós-sexo.
_ Nossa quem diria que a gente um dia estaria aqui hein loira?!
_ Pois é trem, quem diria?!
_É clichê, mas só pra não perder o costume: Foi bom pra você?
_ Foi, agora passa a pizza.

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